quarta-feira, 28 de maio de 2025

Da noção: más decisões, ou o colapso

Sem inclinação para pontos de vista racionais,
agora estes fragmentos são a razão destruída
em parcelas destituídas de noção.


Prendo a respiração e vejo o tempo. Um minuto, uma hora, uma madrugada – ainda não aconteceu o colapso. Se ao menos soubesses o que podia fazer por ti – mas, depois da madrugada ainda escura e com o céu enegrecido, quando as primeiras luzes começarem a despontar, eis o colapso. Ainda não o previmos, muito menos o sentimos, porque a respiração está presa e bem presa com a segurança de más decisões que são tão boas, mas ele está lá – vamos ficar sem ar quando o ponteiro bater retumbante no momento em que acordamos dos passos cambaleantes, dos embates contra paredes, das mãos sem regras e das bocas molhadas sem atrito.

Mas antes, avançamos. Ninguém nos vai encontrar, nem nós próprios – é a beleza da respiração sustida e das más decisões. A minha promessa, a mais profunda, é que vai ser tão bom agora que vai acabar por ser mau depois quando nos apercebermos do inevitável lapso – e vai acontecer.

Fiquemos quietos – se ficares sem ar, eu também fico.

O colapso. Aí está! Fiquei aqui demasiado tempo, algo não está certo. O que é isto cá dentro que me desorienta? Não prendi a respiração como me tinha garantido que ia fazer. Um minuto, uma hora, uma madrugada. Depois, o dia, a noção do lapso e o colapso.

Eu sou a evidência de que o teste da respiração falhou. E tu – se o passaste, que bom para ti. Será que o vou poder repetir? Será que vais ler as cartas que te vou mandar? Será que me deixas repetir o teste? Será que depois terei a pontuação certa para passar com distinção?

Para trás, já! Ninguém vai sobreviver a isto. Não te sei dizer como ou porquê, mas é isso que vai acontecer. Dentro de pouco tempo mostrar-me-ei menos e entretanto mudo o nome, desapareço da noite, pois é no escuro que me vês. Será na luz que terei um novo nome, sem respirações presas, sem testes, sem pontuações.

Pouco barulho! Não vou tolerar o som dos teus passos e dos teus ruídos. É no silêncio que me ouço a perdoar. Atrás de mim, só o vazio. Se vais ter saudades minhas? Não sei. Vida longa à dúvida!

O que nos irá substituir? Ou quem nos irá substituir? Que memória vamos ter do tempo que passámos sem respirar? Que a dúvida persista – até que ninguém saberá o nosso nome.

Estou melhor sem isto – sem jogos e sem sensações. Mas ainda estou todo partido, porque o meu verdadeiro nome continua a ser dito e pensado. De alguma forma ainda não saí deste matadouro – que és tu. Mas se achas mesmo que me viste, tem de ser provado que não. São os candeeiros da cidade que te ofuscam a visão, que te fazem ver silhuetas suspeitas – e não sou eu. Juro que não sou eu!

Noutro sítio, onde me martirizo, onde procuro os instintos para saber dizer não, parar e ter o discernimento de que é preferível isto do que sofrer quando já for tarde demais, a chuva cai sobre mim. O som da escuridão vem na minha direção – é uma enorme pintura de cinzento decadente. Tão frágil, foda-se! Estou desfeito em bocados. A chuva limpa-me o corpo e borrata-me a alma. Todo eu sou uma pintura de perda e perdição. Está perto de acabar. É o fim da minha vontade. No meio do escuro, feixes de luz que cega vão amparar a queda. Rio-me, porque é tudo mentira – é um engano. As minhas próprias mentiras bem estendidas mesmo à frente dos meus olhos, do meu espírito desfocado, da pintura decrépita que é a paixão.

As emoções fluem num relance de luz e brilham lá no fundo, envoltas em palavras, memórias e decisões pouco aconselháveis. Vou descendo em queda lenta e livre, enquanto me iludo, à espera que a aterragem seja um novo amanhecer, onde a escuridão realmente se transforme em luz, onde as palavras mal percebidas por causa do eco se tornem finalmente percetíveis. Vou aterrar e a repercussão terá uma radiação tão gigante e turbulenta que o meu amanhecer será vasto e duradouro – sem sons desperdiçados, sem visões esgotadas e sem mentiras que embateram em si mesmas durante demasiado tempo. Tudo acabará de vez.

Fragmentos espalham-se pelo asfalto – é a morte do tempo e do ser. Menos um dia a ser devorado por ti, menos um momento a tentar abster-me do falhanço e da derrota. Disperso, olho para paredes outrora pálidas, agora pintadas de vermelho, e ainda tremo ao pensar na minha existência sem forma, que se deixou levar por testes de respiração – mesmo com o colapso a ser iminente.

Não houve inclinação para pontos de vista racionais, e agora estes fragmentos são a razão destruída em parcelas destituídas de noção. Incapaz de voltar atrás e guerrear com o que quer que fosse para passar o teste, eu sou a expressão do remorso – a morte do tempo e do ser, tudo numa espiral recessiva que rui infinitamente. Uma explosão de cinzento avermelhado.

E é assim que alguém se torna leve e com o amor arrancado de si: reprovando em testes que se sabem não vir a ter êxito, sair disso com a cabeça levantada, mudando o nome e evaporando-se, deixando-se ir por aí abaixo até se estatelar. E depois voltar ao topo, recomeçar. Repetição. Merda para isto!

E se alguma vez leres isto, não faças perguntas às quais talvez não tenha respostas. Isto é a renúncia ao básico real e explicativo, é a aceitação do aleatório, das más decisões e do colapso.


(26/05/2025)

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